Tuesday, February 13, 2007

Profissão: médico

O que é ser médico hoje? Um desfile de moda? Um exercício de egocentrismo?

Entre em um hospital particular e você verá um número enorme de mulheres de cabelo escovado, unhas longas, salto alto. Não são clientes, são médicas. Onde foram parar as roupas brancas e os sapatos rasos? Saíram de moda? Quando há uma emergência, elas correm pelos corredores com aqueles sapatos? [Se bem que, como bem frisou meu pai, o único lugar em que se pode ver médico com pressa para atender é em filmes.] Os homens são mais discretos, mas nem por isso deixam de adorar o indefectível jalecão branco com um bordado no bolso: Dr. Fulano. Como gostam do apêndice ao nome! Eles se apresentam assim, Bom dia. Eu sou o Doutor Fulano. Que fofo!

Não que as roupas importem realmente. Se o trabalho for bom, quem vai se importar com o que veste o senhor doutor? Eu é que não.

O problema é que...

Cada vez mais os pacientes têm que aturar a má-vontade, a expressão de tédio profundo e o olhar de suprema onipotência com que são observados pelos deuses da saúde. É como se eles não estivessem lá para atender doentes. [Eu tenho uma médica na família que dia desses estava fula da vida porque, durante o seu plantão num hospital público, apareciam pessoas procurando atendimento de madrugada e ela queria poder dormir!]
Ah, e antes que eu me esqueça, um conselho: não ouse fazer perguntas sobre a sua doença ou tratamento; não ouse ser proativo e opinar. Ao paciente cabe ouvir o que o senhor doutor quiser falar, e acatar, porque os médicos estudaram muito e tudo sabem.

Tem também a questão do relógio, totalmente ignorada. Meu grande desafio atual é descobrir um médico que atenda no horário em que eu marco a consulta, porque todos os que eu conheço me deixam plantada na sala de espera por horas, como se eu não tivesse uma vida fora do consultório. A solução é só marcar consultas nas férias, mesmo que o caso requeira maiores cuidados. De repente, pode-se ter a sorte de melhorar com auto-medicação e nem será necessário perder preciosas horas lendo revistas do ano de 1996.

Não há quem me faça pensar diferente: certas profissões são missões. Porque lidar com vidas humanas não é como lidar com cimento e pedras. É o caso do magistério, como disse a Alexandra neste texto, e da medicina, dentre outros. Quem não está à altura dessa responsabilidade deve procurar outros ofícios.

Se você tiver intimidade com um desses seres superiores, pergunte-lhe por que tantos médicos agem com tamanho desrespeito. Você vai ouvir os seguintes argumentos para justificar a displicência: que eles ganham mal, que os planos de saúde pagam pouco pela consulta, que trabalham horas demais, que os pacientes são histéricos e procuram atendimento sem motivo, blá, blá, blá. E você pode até concordar com isso tudo, mas aí você pára para pensar e se pergunta: Ué, mas quando eles decidiram cursar medicina, as condições já não eram essas?

7 comments:

Suzana Elvas said...

Lys, querida; eu cansei de trocar de médico por conta dessa cara de "ai-mais-uma-metida-a-querer-entender-da-própria-saúde". Fiquei 11 horas (sim, onze) esperando um endoscopista no Barra d'Or. O primeiro pediatra das meninas disse que meu leite era fraco e eu tinha que usar Nan - eu, a vaca leiteira que doava litros de leite materno.
Enfim... Eu agora tomo duas providências quando tenho consulta: só entrego meu cartão do plano depois da consulta, jamais antes; e se passar de 30 minutos de espera peço atestado - e aviso que, se descontada no trabalho, pedirei reembolso do médico (e mostro a portaria do Direito do Consumidor dizendo isso).
Bjs

Anonymous said...

Recentemente, precisei levar minha mãe (que deslocou o ombro numa queda) ao mesmo hospital mencionado pela Suzana. Não vi médicas de salto alto (todas usavam sapatos baixos), mas o restante do que você descreveu foi muito parecido com o que presenciei.
Esperei horas a fio (sem uma notícia sequer) por minha mãe, levada para uma sala sabe-se lá onde, e sem ter como me informar sobre o que estava acontecendo — se é que estava mesmo acontecendo algo.
No caso específico deste lugar parece haver uma explicação para tanta demora: há duas entradas, a da emergência (ou dos pobres) e a principal (ou dos ricos). O curioso é que a emergência, de fato, fica por conta da entrada que não leva este nome. Deu pra entender, não?
Em todo caso, tirando a espera quase interminável, o tratamento não foi ruim — mas creio que demos sorte, muita sorte, ainda mais por termos chegado à noite. Preciso dizer que saímos de lá de madrugada?
Eu também acho que não há desculpas para um atendimento ruim a quem está justamente num momento frágil. Afinal, não se trata de um serviço beneficente, todos estão sendo pagos por um trabalho que deveriam realizar com competência absoluta (já que se trata da vida humana). Se não estão satisfeitos com as condições que não ignoravam antes de assumirem seus postos deveriam mesmo procurar outro lugar, ou ainda outro ofício.

Lys said...

Suzana, ainda que só entreguemos o cartão do plano ao final da consulta, pense em todo o aborrecimento por que temos que passar até sermos atendidas. É um tempo interminável em que fico pensando em todo o trabalho se acumulando no escritório e no meu chefe olhando para o relógio e se perguntando aonde diabos eu fui na verdade. Porque, em geral, passo umas três horas fora cada vez que saio para uma consulta. Não bastassem estarem sempre atrasados, os médicos ainda atendem os representantes das indústrias farmacêuticas e os “encaixes”. Não há como tolerar tanto desrespeito.

Wagner, incrível como você conseguiu captar a dinâmica do Barra D’Or. Em janeiro, precisei levar meu pai à emergência lá e tomei um baita susto quando cheguei à sala de espera e vi a pequena multidão que aguardava atendimento; parecia SUS! Chegamos às 17h e só conseguimos sair de lá às 23h50min. Tal como aconteceu com você e sua mãe, quando ele finalmente foi atendido, sumiu lá dentro e ficamos um tempão sem notícias. Por outro lado, quando, já em fevereiro, meu pai foi operado no mesmo hospital, foi tudo radicalmente diferente. A entrada principal, pela direita, dá para um outro universo, com atendimento tão bom e cortês que parece que estamos num hotel. Vá entender.

Anonymous said...

vocês estão generalizando muito, temos profissionais ruins sim, e isso deve ser mudado, porém, temos outros com extrema competencia.. é mal do brasileiro enxergar só as coisas ruins. Devemos valorizar a profissão de médico, ninguém fala que a profissão médico é que tem o indice de alcoolismo mais alto, engraçado que todo mundo reclama de quanto tempo ele demora pra atender, mas isso ninguém comenta, né? A culpa não são dos médicos, e sim do sistema. Não devemos lutar contra os médicos e sim contra o governo que é o maior ataque a nossa saude!

Danss (x said...

LOOOOOOOOL?!

KathY CatherYne said...

Bem, eu sou estudante de medicina, mas também sei o que é ser atendida por um médico de jaleco branco e nariz empinado que não olha para a tua cara... Aliás, a maioria dos médicos pelos quais passei são desse tipo ~ triste. Como dependo do SUS, tenho algumas (nem tão) boas experiências...
Fato é que eu ri muito lendo o post, e sei muito bem das condições da profissão médico. Nahhhh, salto alto no hospital? Por favor ¬¬

Anonymous said...

Olha... Ser médica não é fácil.

Primeiro: sou chamada de enfermeira frequentemente pelos meus pacientes. Será que é porque eu punciono veias na minha especialidade? Será que mulher não pode ser médica?

Segundo: quem marca minhas consultas é o hospital, e este quer produtividade. Tenho agenda de 10 em 10 minutos. Se atendo bem, levo mais que 10 minutos e daí atraso as consultas... Daí os pacientes reclamam. Alguma sugestão inteligente?

Terceiro: enquanto todos estão na praia num feriado ou final de semana, ou dormindo na madrugada, eu estou acordada, de bom humor e trabalhando. Que tal só procurar um médico nesses horários se realmente precisar? E não para pegar receita que esqueceu ou atestado para piscina...

Em tudo, há os dois lados. Entendo pessoas insatisfeitas, tanto médicos como pacientes.
Todos precisam melhorar.
Hoje só trabalho em SUS por opção. Mas está longe de ser meu sonho quando resolvi ser médica.

Reflitam.